Fratura do Teto da Órbita e Contusão Hemorrágica Frontal pela Bomba de Chimarrão

Dr.Ivan Hack e Dr. Ivo Maximiliano Strimitzer Junior, publicaram no Jornal Brasileiro de Neurologia um case real com o intuito da conscientização e cuidados em um simples ato diário nosso "Gaúcho", frente a lesões irreversíveis.

Tomar chimarrão dentro do automóvel, no assento do carona ou ao volante, faz parte do comportamento de muitos gaúchos nos finais de semana. Em função disso, Dr.Ivan Hack e Dr. Ivo Maximiliano Strimitzer Junior relatam o caso de uma paciente com fratura do teto da órbita e contusão cerebral hemorrágica frontal provocada pela bomba de chimarrão durante acidente de trânsito.

O chimarrão é a bebida símbolo do Rio Grande do Sul. Ele faz parte da identidade e da tradição cultural do gaúcho. Sorver o chimarrão é um hábito diário, passado de gerações em gerações, muitas vezes tomado em roda de amigos. O chimarrão é feito a partir da erva-mate, água quente até 64°C, cuia e bomba que é feita de metal e serve para sorver o mate.

Embora não seja recomendado, muitos gaúchos, principalmente nos finais de semana, têm o hábito de sorver o mate ao volante. Em função deste costume, os autores relatam o caso de uma paciente que sofreu um raro traumatismo cranioencefálico provocado pela bomba de chimarrão enquanto passeava de carro.

Paciente do sexo feminino, 34 anos, passeava no domingo, sentada no assento de carona, à direita do motorista, com a cuia de chimarrão nas mãos. O automóvel foi abalroado na sua traseira e, instantaneamente, a bomba de chimarrão penetrou na órbita direita, acima do olho da paciente. Após penetrar na órbita, de maneira reflexa a bomba foi retirada. O trauma provocou edema local e dor ocular. A paciente passou a apresentar diplopia e cefaleia. Não ocorreu perda visual. Após consulta em serviço de urgência foi submetida a tomografia computadorizada que evidenciou fratura do teto da órbita direita com deslocamento cranial de fragmento ósseo e contusão cerebral hemorrágica orbitofrontal. A paciente foi tratada clinicamente tornando-se assintomática em 15 dias, não apresentando alteração dos movimentos oculares ou perda visual e com exame neurológico normal.

As causas mais frequentes de neurotrauma são acidentes de trânsito, quedas, agressão física, acidentes de trabalho e esportes. Segundo dados do Center for Disease Control and Prevention (CDC) nos Estados Unidos, em 2017, 61.131 pessoas morreram devido a traumatismo cranioencefálico (TCE). No entanto, o que é mais significativo é que 44% das mortes entre 2015-2017 foram traumas intencionais, isto é, suicídios e homicídios.

No Brasil, embora os dados epidemiológicos sejam escassos as causas mais frequentes de admissão hospitalar por TE são as quedas e acidentes de trânsito, com destaque para aqueles envolvendo motocicletas. Conforme o Ministério da Saúde, em 2017, morreram 35.374 pessoas vítimas de acidentes de trânsito e, se comparado aos 42.844 óbitos de 2010, ocorreu uma redução de 17,4%.

Ainda segundo dados do Ministério da Saúde (2018), 19,5% da população das capitais brasileiras afirmou que fazia uso do celular enquanto dirigia. Outro hábito que muito gaúchos têm, é o de tomar chimarrão dentro do veículo, inclusive quando estão dirigindo.

O escritor Fabrício Carpinejar retratou a relação do gaúcho com o chimarrão, automóvel e final de semana com a crônica "Chimarrão ao volante", publicada em um dos principais jornais da região sul em maio de 2018. Citando Carpinejar: "já recebi multa por dirigir com o celular.... Mas nunca fui autuado por andar com o chimarrão no meu colo....". Ainda, segundo o escritor se houvesse uma lei contra o chimarrão ao volante: "...Seria o estopim de uma segunda Guerra dos Farrapos. Não agradaria a chimangos e maragatos, gremistas e colorados.… Porque, se chimarrão fosse violação, metade dos motoristas de Porto Alegre extrapolaria a cota de 20 pontos e, teria a sua carteira cassada... No final de semana, é um desfile farroupilha nas grandes avenidas. Basta parar na sinaleira e espiar ao lado que verá um gaúcho sorvendo o seu amargo"

O objetivo do artigo do Dr.Ivan Hack e Dr. Ivo Maximiliano Strimitzer Junior, foi apresentar uma causa inusitada de fratura do crânio com lesão encefálica e, além disso, alertar, principalmente, os gaúchos sobre o comportamento de risco ao volante, onde uma inofensiva bomba de chimarrão pode tornar-se uma arma capaz de ocasionar lesões irreversíveis.